CONTROVERSO, MAS OBRIGATÓRIO
Para um romance publicado em 1959, Tropas Estelares mostra que ainda pode chamar atenção. Livro controverso, praticamente fundou um subgênero literário (a FC militar). Além de influenciar a indústria do entretenimento (principalmente, os games) e a indústria bélica, inspirando projetos para criação de super trajes de combate. Também provocou diversas polêmicas, com ataques e defesas das ideias de Heinlein.
Do ponto de vista narrativo, o livro pouco se sustenta. O protagonista tem apelo, em sua ironia ou em seu drama exposto, nos melhores momentos de dúvidas pessoais, do seu papel na sociedade e em algumas descrições vívidas sobre o cotidiano militar. Mas nos piores momentos, essa mesma voz se perde numa minúcia irritante sobre condutas e patentes e numa devoção cada vez maior pelo espírito de corpo das Forças Armadas. A burocracia militar é descrita em muitas páginas, enquanto que os conflitos internos dos personagens e a guerra contra os insetos alienígenas não são devidamente explorados.
Em termos filosóficos, o romance procura vender uma ideologia do mérito pelo esforço militar. Neste mundo, os cidadãos que decidem o destino da sociedade, que podem votar, são aqueles que servem as Forças Amadas. Sendo considerados como gente mais sábia porque pensam mais em termos gerais, no todo, do que pessoais, no indivíduo. Ninguém é obrigado a se alistar. Mas quem o faz tem mais chance de provar que é capaz de tomar decisões melhores, porque lutou, literalmente, por seu way of life. Diferente daqueles que supostamente receberam a liberdade de mãos beijadas.
Heinlein discorre bastante, por meio de seus personagens, sobre temas como dever, responsabilidade, o preço da liberdade, altruísmo, o valor do coletivo e do indivíduo. Ele promove uma utopia militarista, mas não de maneira rasa. As políticas e estruturas sociais e burocráticas de sua sociedade ideal podem gerar uma interessante discussão sobre poder, formas de governo e a vontade do povo.
A maior falha do seu raciocínio foi não deixar mais evidente como funcionaria uma sociedade considerada democrática, mas com uma elite tão bem definida. Que tipo de elite votante seria essa? E onde se encaixaria a frustração social de quem não pode decidir sobre o próprio destino? E a vida militar seria a única contribuição social efetiva? E o que dizer sobre a corrupção nas altas esferas, movida por interesses pessoais de riqueza e status? O livro é um reflexo do cenário após a Segunda Guerra Mundial e a Guerra da Coréia, com o receio do avanço comunista. Mas, curiosamente, a forma de governo pensada por Heinlein guarda semelhanças com a China atual, uma sociedade de consumo que tem uma elite administrativa fortemente militarizada.
Como ficção apenas, o livro não convence. Como manifesto político apenas, idem. Mas é o conjunto do que há de melhor nesses dois aspectos que faz de Tropas Estelares um romance influente para outros autores e ainda relevante para o debate.
Tropas Estelares, de Robert A. Heinlein, 352 págs., Aleph
AVALIAÇÃO: RUIM, REGULAR, BOM, MUITO BOM, EXCELENTE